quarta-feira, 30 de novembro de 2016

BARROCO (SEISCENTISMO OU ROCOCÓ) EM PORTUGAL E NO BRASIL

       PLANO DE AULA DE LITERATURA

Colégio ou escola:
Turma: Qualquer uma do 1º ano do ensino médio.
Professor: Márcio Alessandro de Oliveira.
Data:  /  /  .
Duração da aula: Uma hora e quarenta minutos.
Recursos: Para a exposição da matéria de que tratará a aula: lousa e giz.  (Na falta destes, quadro branco e marcador.)  Para a atividade em sala: fotocópias para a leitura de poemas adicionados a este plano.  Serão necessários dois recursos: projetor, para exibição de pinturas, esculturas, o texto que pode ser levado ao quadro, caso o professor queira exibi-lo na forma de slides, e rádio, para a reprodução de música barroca.
Tema e título da aula: Barroco (seiscentismo ou rococó) em Portugal e no Brasil.
Unidade didática: Barroco.
Atividades em sala: Leitura dos poemas selecionados e adicionados a este documento e resolução de questões (das quais a segunda é passível de anulação).
Atividades para o lar: Atividades ou questões do livro didático e leitura do texto A retórica falada usada como cabresto.
Pré-requisitos: Conhecimentos sobre: índices, ícones, símbolos, linguagens não verbais, língua, conceitos de literatura, literariedade, sistema simbólico, sistema literário, estilo (escola) de época, diferenças entre prosa e poesia, Renascimento e Classicismo.
Objetivo geral: Expor, em linhas gerais, o Barroco como escola e seu contexto histórico, para que os sentidos dos textos sejam construídos com os subsídios apresentados em forma de datas e fatos históricos que condicionam a arte.  (Crítica ao objetivo: Na aula de Literatura, deveria o texto literário ser o centro de gravidade da aula, e por isso a próxima deve se concentrar nos escritos selecionados.)
Objetivos específicos:
: apontar o Maneirismo e conceituar o Barroco de acordo com a possível significado original do nome;
: enumerar artes barrocas e alguns nomes importantes a elas vinculados;
: enunciar os marcos inicial e final nos dois países (Portugal e Brasil);
: apontar fatos históricos que podem ter condicionado as manifestações literárias barrocas em ambos os países;
: denominar algumas das características da literatura barroca, como a influência de Luís de Gôngora y Argote;
: mencionar autores, biografias, obras e reação do público de suas épocas.  (Não é só o contexto histórico que condiciona a literatura: para Todorov, a vida do autor também faz isso.)   
Conteúdo: Toda a matéria do texto que será levado à lousa (ou à tela do projetor).
Desenvolvimento: O professor inicia a aula com os cumprimentos de etiqueta elementar, seguidos da revisão da matéria anterior, da correção dos exercícios e da verificação do cumprimento dos pré-requisitos necessários à compreensão da aula de que trata este documento.  Terminadas essas etapas, começa a copiar no quadro o texto que contém a matéria tentando alternar a atenção (caso não use o projetor): num momento olha para o quadro, em outro, para a turma.  Tenta dar, de viva voz, as explicações intercaladas entre parênteses (que funcionam mais ou menos como rubricas de um script) com o texto que será exposto na lousa.  No fim da aula, o professor distribui folhas de exercícios, indica atividades do livro didático adotado pela escola e expõe os requisitos da próxima aula, cujo tema é o Arcadismo.
Referências bibliográficas:
CÂNDIDO, Antônio.  Literatura e Sociedade. 9ª edição, revista pelo autor.  Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2006.
CARVALHO, Luiz Fernando Medeiros; COUBE, Fabio Marchon.  Aula 1 - As muitas vozes da persona satírica na poesia atribuída a Gregório de Matos.  In.: Literatura Brasileira II.  Rio de Janeiro: Fundação Cecierj, 2014.
COTRIM, Gilberto.  História Global: Brasil e Geral (vol. único).  8ª edição.  São Paulo: Saraiva, 2005.  
FARACO, Carlos Emílio; MOURA, Francisco Mato.  Literatura Brasileira.  17ª edição, São Paulo: Editora Ática, 2003.
INFANTE, Ulisses.  Curso de Literatura de Língua Portuguesa.  1ª edição, São Paulo: Scipione, 2001.
LOIVOS, Anabelle; PASCHE, Marcos; PIETRANI, Anélia. Aula 1 – Do Barroco e sua permanência no tempo que trota a toda ligeireza.  In.: Literatura Brasileira V: Tradição e ruptura.  Rio de Janeiro: Fundação Cecierj, 2015.
OLIVEIRA, Ana Tereza Pinto de; REIS, Benedicta Aparecida Costa dos.  Minimanual Compacto de Literatura Portuguesa: teoria e prática.  1ª edição.  São Paulo: Rideel, 2003.
TUFANO, Douglas.  Estudos de Literatura Brasileira.  2ª edição.  São Paulo: Editora Moderna, 1978.
MATOS, Gregório.  Obras completas de Gregório de Matos.  Crônica do viver baiano seiscentista: VI Volume.  Coleção Os baianos.  Salvador, BA, Editora Janaína Ltda..
VERISSIMO, Erico.  Breve história da literatura brasileira.  3ª edição.  São Paulo: Globo, 1996.  Tradução: Maria da Glória Bordini.  (Título original: Brazilian literature an outline.)
(Texto para quadro.)

BARROCO (SEISCENTISMO OU ROCOCÓ) EM PORTUGAL E NO BRASIL (último período do Renascimento)

1.      Maneirismo: Para alguns, Maneirismo é a transição entre o Classicismo e o Barroco, cujo nome, que poderia ser associado ao mau gosto e ao exagero, significaria pérola de formato irregular.

2.       Artes barrocas além da literatura:
Pintura: Caravaggio, autor de Vocação de São Mateus.
            Música: Vivaldi (italiano) e Johann Sebastian Bach (alemão), autor de Toccata in D Minor.
            Escultura: Aleijadinho.

3.       Marcos iniciais e finais da literatura barroca:
Portugal:
Início: 1580, ano da morte de Camões.
Fim: 1756, ano da fundação da Arcádia Lusitana.

Brasil:
Início: Prosopopeia (1601), de Bento Teixeira (1561-1600).  (O texto é imitação barata de Os Lusíadas, e foi feito em homenagem a Jorge de Albuquerque Coelho, terceiro donatário da capitania de Pernambuco.)
Fim: 1768, ano da publicação de Obras, de Cláudio Manuel da Costa (MG, 5/6/1729-MG, 4/7/1789).

            4.  Contexto histórico:
4.1. Portugal:
            Estados absolutistas;
            Contrarreforma: Companhia de Jesus e Concílio de Trento;
            desaparecimento do rei D. Sebastião em Alcácer-Quibir (1580);
            domínio espanhol sobre Portugal (1580-1640).

4.2.  Brasil:
capitanias hereditárias (até 1759);
governo geral (a partir de 1759).

5.      Características da literatura barroca:
influência de Luís de Gôngora y Argote (1561-1627);
         linguagem rebuscada: uso de jogos de palavras e de construção para a experiência sensorial: cultismo (gongorismo ou culteranismo);
            rebuscamento do conteúdo pela conciliação de opostos: conceptismo;
            teocentrismo X antropocentrismo;
            oposição à sobriedade e ao racionalismo do Renascimento;
            conteúdo religioso;
            sátira.

6.      Autores, coletâneas e academias:

Portugal:
Autores (poetas):
Francisco Rodrigues Lobo;
Antônio Barbosa Bacelar;
Francisco de Vasconcelos;
Jerônimo Baía;
Tomás Pinto Brandão;
Soror Violante do Céu (poetisa).

Coletâneas:
Fênix renascida (cinco volumes);
Postilhão de Apolo (dois volumes).

Academias (de Lisboa):
Academia dos Singulares;
Academia dos Generosos.

Brasil:
Autores e obras:

Antônio Vieira (padre) (Portugal,1608; Bahia, 1697).
Produções que se destacam: Sermão da Sexagésima e História do Futuro.
Características: parenética, sebastianismo, cultismo, conceptismo, escravidão, invasão holandesa e defesa dos judeus e cristãos-novos.
Gênero: sermão.

Gregório de Matos, o Boca de Brasa ou Boca do Inferno (Salvador, 1633; Recife, 1696).
Características: sátira, religiosidade, cultismo e conceptismo.
Gênero: poesia satírica.


                                QUESTÕES DE VESTIBULAR* E ENEM

       Aluno(a):____________________________________________________________
       Turma:_____________

1.       (Centec-BA) Não é característica do Barroco a:
a)      preferência pelos aspectos científicos da vida.
b)      tentativa de reunir, num todo, realidades contraditórias.
c)      angústia diante da transitoriedade da vida.
d)     preferência pelos aspectos cruéis, dolorosos e sangrentos do mundo, numa tentativa de mostrar ao homem a sua miséria.
e)      intenção de exprimir intensamente o sentido da existência, expressa no abuso da hipérbole.

2.      (FCMSC-SP) A preocupação com a brevidade da vida induz o poeta barroco a assumir uma atitude que:
a)      descrê da misericórdia divina e contesta os valores da religião.
b)      desiste de lutar contra o tempo, menosprezando a mocidade e a beleza.
c)      se deixa subjugar pelo desânimo e pela apatia dos céticos.  
d)     se revolta contra os insondáveis designíos de Deus.
e)      quer gozar ao máximo seus dias, enquanto a mocidade dure.

3.      (Positivo-PR) O estilo rebuscado que retrata os dilemas entre os apelos de ordem espiritual e os atrativos de ordem material, mais o exagero no emprego dos recursos estilísticos, são características da escola:
a)      barroca
b)      arcádica
c)      romântica
d)     realista
e)      modernista




Questão 111 do Enem 2014 (extraída do sítio Conversa de Português)

Quando Deus redimiu da tirania
Da mão do Faraó endurecido
O Povo Hebreu amado, e esclarecido,
Páscoa ficou da redenção o dia.

Páscoa de flores, dia de alegria
Àquele povo foi tão afligido
O dia, em que por Deus foi redimido;
Ergo sois vós, Senhor, Deus da Bahia.

Pois mandado pela Alta Majestade
Nos remiu de tão triste cativeiro,
Nos livrou de tão vil calamidade.

Quem pode ser senão um verdadeiro
Deus, que veio estirpar desta cidade
o Faraó do povo brasileiro.

(DAMASCENO,  D. Melhores  poemas: Gregório de  Matos. São Paulo: 2006.) 

Com uma elaboração de linguagem e uma visão de mundo que apresentam princípios barrocos, o soneto de Gregório de  Matos apresenta temática expressa por
(A) visão cética sobre as relações sociais.
(B) preocupação com a identidade brasileira.
(C) crítica velada à forma de governo vigente.
(D) reflexão sobre dogmas do Cristianismo.
(E) questionamento das práticas pagãs na Bahia.

(*) As três primeiras questões foram extraídas do Minimanual Compacto de Literatura Portuguesa: teoria e prática, de Ana Tereza Pinto de Oliveira e Benedicta Aparecida Costa dos Reis. 1ª edição.  São Paulo: Rideel, 2003.

(Gabarito: a; e; a; c.)



POEMAS DE GREGÓRIO DE MATOS

QUERIA O POETA DIVERTIR SEUS AMOROSOS INCÊNDIOS
COM UMA MOÇA ALI ASSISTENTE, E PEDINDO-LHE ESTA
DINHEIRO ANTECIPADAMENTE, ELE LHE RESPONDEU
COM ESTAS



DÉCIMAS

1
                     Eu perco, Nise, o sossego,
                     E não posso isto entender,
                     Pois vos queixais de não ver,
                     E eu sou triste, o que ando cego:
                     Que heis de ver? Se do pespêgo,
                     Fugis com ligeiro passo?
                     Não corrais, um breve espaço:
                     parai: não vos ausenteis,
                     deitai-vos, que vós vereis,
                     mais vereis, o que eu vos faço.

2
                     Eu sou vosso companheiro
                     nestas cegueiras ímpias,
                     pois há mais de trinta dias,
                         que não posso ver dinheiro:
                     eu não sou home embusteiro,
                     hei de vos satisfazer,
                     e se quereis corriger
                     a vista sem mais antolhos,
                     esfregai mui bem os olhos
                     e esfregada haveis de ver.




3
                      Não me trazeis vós tão farto
                      que vos deva eu um vintém,
                      e em Parnamerim ninguém
                      paga à puta antes do parto:
                      vós não me entrais no meu quarto,
                      nem eu os quartos vos bato,
                      e não sou tão insensato,
                      que ainda que faminto ando,
                      vos vá o pato pagando,
                      se sei que outro coma o pato.

4
                     Desta sorte, Nise ingrata,
                     de querer de antemão ver,
                     temo, que sempre heis de ter
                     na vista essa catarata:
                     não vereis ouro, nem prata,
                     e pois vos desassossega,
                     o jimbo, que se vos nega,
                     nunca, Nise, o heis de ver,
                     porque do muito querer,
                     de faminta estais tão cega.






Fonte: Gregório de Matos.  Obras completas de Gregório de Matos.  Crônica do viver baiano seiscentista: VI Volume.  Coleção Os baianos.  Salvador, BA, Editora Janaína Ltda..  Atualizada a grafia de acordo com as normas vigentes em 2016.


Descreve o que era realmente naquele tempo a cidade da Bahia de mais enredada por menos confusa

            A cada canto um grande conselheiro,
            Que nos quer governar a cabana, e vinha,
            Não sabem governar sua cozinha,
            E podem governar o mundo inteiro.

            Em cada porta um bem frequentado olheiro,
            Que a vida do vizinho, e da vizinha
            Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha,
            Para a levar à Praça, e ao Terreiro.

            Muitos mulatos desavergonhados,
            Trazidos os pés dos homens nobres,
            Postas nas palmas toda a picardia.

            Estupendas usuras nos mercados,
            Todos, os que não furtam, muito pobres,
            E eis aqui a cidade da Bahia.

           Fonte: MATOS, Gregório de.  Obra Poética.  2 ed.  Rio de Janeiro: Record, 1990, v.1, p. 33.  Apud: INFANTE, Ulisses.  Curso de Literatura de Língua Portuguesa.  1ª edição, São Paulo: Scipione, 2001, p. 165.


A RETÓRICA FALADA USADA COMO CABRESTO

“Há de tomar (...) uma só matéria, há de defini-la (...), há de dividi-la (...), há de prová-la (...), há de declará-la com a razão, há de confirmá-la com o exemplo, há de amplificá-la com as causas, com os efeitos (...), há de impugnar e refutar (...) os argumentos contrários.  (...)  e o que não é isto é falar de mais alto.”  (Padre Antônio Vieira, mencionado por Ulisses Infante em Curso de Literatura de Língua Portuguesa.)

Pastores evangélicos contam com um poderoso instrumento de persuasão e controle: a palavra falada, que é muito diferente da palavra escrita.  Esta não conta nem com as inflexões de voz, nem com os gritos, nem com os gestos corporais.  Essas linguagens não-verbais são poderosos instrumentos que auxiliam o discurso falado e, portanto, o ofício de dominar rebanhos de espíritos pobres, doentes, iletrados e pouco críticos que vão à igreja.
Como muitos dos pastores são iletrados, é natural que usem a oratória, e não a retórica escrita.  Contudo, mesmo se fossem mais cultos, não se atreveriam a depositar suas chances de ascensão e dominação apenas nos discursos redigidos: a plebe rude que manipulam não lê, e, para eles, isso é muito vantajoso, pois que podem recorrer à retumbância, ao impacto da entonação e do grito (que continuariam a ser as suas ferramentas preferidas mesmo se os manipulados fossem leitores; a prova disso é Hitler, que não dependeu do seu livro, Minha Luta, para dominar a Alemanha: dependeu da oratória hipnótica).  Independentemente do grau de letramento do pastor, para ele é indispensável a oratória inflamada.
Um exemplo: Se eu escrevo: “Conseguimos um crescimento de apenas 1%, enquanto os outros países conseguiram um de 30%”, há informação pura e simples: não comove (com exceção de casos de pessoas que dependam de um crescimento muito acima de 1% para evitar um ataque do coração, por exemplo) nem influencia a opinião do leitor de forma muito explícita.  Mas se eu falo: “Conseguimos um crescimento de apenas [aqui a voz fica baixa e fina; o rosto se contorce] 1%, enquanto os outros países conseguiram um de [aqui o falante aumenta o tom da voz sem deixar de erguer as sobrancelhas] 30.”  Essa técnica os pastores conhecem, e levaram-na ao extremo.  O “30” fica destacado, o ouvinte perde a capacidade de pensar na diferença entre porcentagens e números reais e se deixa levar pelo sentimento que cega.
Não é de surpreender que prefiram os sacerdotes protestantes a oratória à redação: herdaram dos judeus o hábito de valorizar a audição para “ouvir a voz de Deus”, ao passo que a visão, sentido que, segundo leio, era mais valorizado pelos gregos, ficou em segundo plano.  Mas é pela audição que vem a cegueira.
Conclamo que todos os professores de língua se rebelem contra a manipulação dos pastores.  É fundamental que esclareçamos os espíritos para que não sejam possuídos pelas ideias danosas das igrejas.  Para isso, é fundamental uma educação linguística de qualidade, uma educação que contemple a prática de bem falar e a de bem escrever aliadas à dialética e à dialógica: só elas podem evitar que inocentes caiam nas armadilhas de quem só convence por falar mais alto.

(Márcio Alessandro de Oliveira. Duque de Caxias, 30/5/2015. Publicado originalmente no Facebook.)